Pode até parecer mais uma obra de ficção entre outras tantas que pus neste espaço, mas o que relatarei agora não tem ligação alguma, o que não posso dizer com muita clareza, com o conto que publiquei sobre o Napoleão Silva. Napoleão Silva é uma personagem que foi criada por mim a partir de um simples exercício mental, não tendo havido até então nenhum tipo de inspiração concreta no mundo real.
No entanto, hoje, mais exatamente há uns dez minutos atrás, presenciei um acontecimento do qual fui coadjuvante e que me fez pensar agora que sem dúvida existe uma relação entre o que pensamos e o que vivemos.
Saí do colégio depois de uma manhã tranquila, na qual não tive que substituir professores em nenhuma aula. Vim para casa dirigindo e ouvindo músicas no rádio como faço todos os dias e pensando nos meus afazeres programados para tarde, sem saber que um evento que ocorreria por volta das doze horas mudaria meus planos de ter uma tarde comum.
Ao estacionar meu automóvel em frente a minha casa, desliguei o som que sintonizava uma dessas rádios jovens, peguei alguns livros e cadernos que eu havia posto sobre o banco traseiro e saí do carro. Neste mesmo momento, ao me virar à rua depois de ter girado a chave para trancar a porta do carro, avisto na outra calçada uma senhora muito idosa sendo amparada por uma dessas acompanhantes de idosos. Ao perceber a dificuldade da senhora idosa em manter o equilíbrio, vou ao seu encontro rapidamente já perguntando se estava tudo bem ou se ela necessitava de algo. Propus-me a levar um copo d´água ou uma cadeira já que estávamos exatamente em frente a minha casa.
A acompanhante da senhora disse-me estar tudo bem e que a senhora já estava melhor. Foi quando a senhora, que até então estava de costas para mim e sendo amparada pelos braços de sua acompanhante, virou-se. Olhando seu pequeno rosto, muito branco e enrugado, que acolhia dois olhinhos azuis e muito brilhantes, perguntei se ela estava com tontura.
E neste momento uma rajada de vento atingiu em cheio o que eu poderia ter de mais profundo e arrastar todos os medos que poderiam, por ventura, afligir-me. A resposta daquela senhora frágil de cerca de noventa anos atacou toda a minha pretensiosa força e invencibilidade proporcionada pelos meus vinte anos. A resposta foi tão violenta que a moça que acompanhava a senhora tentou até se justificar, já que o meu choque naquele momento tenha sido impossível de ser disfarçado. A pobre moça disse que aquilo era culpa de fortes medicamentos. Obviamente não acreditei nessa tese, uma vez que a lucidez que os olhos daquela senhora deixava transparecer me impediam de cair no engano de que ela não sabia o que estava falando.
Ao perguntar se ela estava com tontura, o furação que se abateu sobre todas as bases que eu tinha foi ela ter olhado bem dentro de meus olhos e respondido com uma voz muito baixa e quase incompreensível, tão frágil quanto a senhora:
- Não. Estou com velhice.
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sexta-feira, junho 01, 2007
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