
E agora tenho o prazer de entregar o prêmio de melhor livro de ficção deste ano para... o autor de “Por Obséquio, Cale a Boca!”, Chico Menegídeo!
É então, eu tava a fim de fazer algo diferenciado, sabe? Algo que pudesse trazer de volta a primavera da minha vida, que nem, ou melhor, igual que nem eu era garoto e brincava na rua e via as coisas que nem elas são, via tudo do mesmo nível, podia sentir, cheirar, até lamber qualquer coisa e daí eu tinha certeza de como tudo era de verdade. Hoje se eu fizer isso na rua, não sei, podem até achar esquisito e que eu to precisando de alguma coisa ou que eu to louco mesmo, não dá mais, sabe? Mas é uma pena, sinto muita falta, quer dizer, tem um monte de coisa que eu já experimentei ou já cheirei ou sei lá o que eu fiz, mas que eu já sei como é, mas tem muita coisa nova pelas ruas e dá uma vontade, mas aí eu tenho que me segurar pra manter a sociedade tranqüila, e mesmo as que eu já sei, hummm, ainda me vem a vontade, porque, bom, sabe, as coisas parecem que mudam quando a gente cresce, não sei, mas eu tenho a impressão de que as coisas são mais gostosas quando a gente é pequeno, igual que nem um sorvete de uva que saía de uma garrafa e que vendia perto do colégio, achava a maior delícia do mundo até o dia em que eu parei de tomar, que eu nem sei por que foi, mas sei que um dia desses tava andando e vi o raio do carrinho do sorvete e quis tomar depois de dez anos, é uma merda! Não tem gosto de nada, até joguei no bueiro, mas não é isso o que eu lembro de quando era garoto, sabe? Aí eu fico com a vontade de ver se ainda é a mesma coisa ou tudo muda que nem o sorvete de uva, não sei, também às vezes acho que é melhor nem testar mais nada que é pra não ter mais decepção, mas ainda dá vontade! Mas é disso que fala o meu livro. E não que eu tive uma infância rica não, quer dizer, que não que eu tinha dinheiro e passava bem, igual que nem aquele sorvete lá, eu trocava muita merenda por moedinha pra conseguir tomar, pois é, se eu soubesse que era uma merda antes tinha me alimentado melhor, acho que é por isso que eu sou meio atarracado, sabe? Mas é, uma infância pobre é mais rica que qualquer adultância. E é mais ou menos isso aí, mas no livro eu explico bem melhor.